Hoje: 22-11-2024
Página escrita por Rubem Queiroz Cobra
Site original: www.cobra.pages.nom.br
A conversação é um tópico importante para ser examinado quando a preocupação é o bom transcurso de uma recepção. Ainda que se trate de um simples encontro informal para beber e conversar, deve ser levada em conta numa certa medida.
É muito repetido que a conversação é uma arte, e este dito deve ser levado a sério. Como arte, a conversação não é julgada pela qualidade informativa, mas sim pela qualidade dos sentimentos que desperta, se eles aproximam ou afastam os interlocutores. Interessa evitar modos que criam antipatia, e descobrir e praticar os modos que, ao contrário, induzem simpatia e felicidade no convívio. Neste sentido, existem coisas a serem evitadas na conversação, e coisas a valorizar e praticar.
Atenção. Conversar é falar e ouvir. É necessário saber ouvir com atenção, a fim de se poder dar uma opinião pertinente e rica como resposta. O bom ouvinte dá ao interlocutor atenção máxima, embora acompanhada de certa atenção também para o que se passa em geral no ambiente.
Tratamento. O emprego de “Senhor” no tratamento é o mais certo, mesmo nas situações mais formais, conforme explico em minha página sobre pronomes de tratamento. No Brasil não se chama uma mulher pelo seu sobrenome e portanto não se diz, por exemplo, “Sra. Torres”, ou “Senhor Pinto”.
O olhar. Olhar uma pessoa é um gesto que pode transmitir diretamente sentimentos, comunica ódio, expressa amor, repreensão, advertência, preconceito, encorajamento, etc. Fitar com interesse o interlocutor em uma conversa é prova de consideração e por isso uma atitude que desperta simpatia. O olhar é a garantia da atenção. Em um grupo, quem fala deve procurar fitar a cada um dos parceiros para distribuir sua atenção e com isto assegurar, também, a atenção de todos para o que diz.
Se você ou seu grupo é abordado por alguém a quem você não gostaria de dar atenção por algum motivo, esteja da mesma forma atento ao que essa pessoa disser. Ostentar falta de atenção e alheamento para forçar o indesejável a deixar o grupo seria uma grosseria inútil, já que provavelmente não surtiria efeito. Espere a oportunidade de pedir licença e se afastar.
Onde conversar. Para conversar, não se coloque nas portas e passagens estreitas. Se a sala de estar é pequena para o número de convidados, e você não é o convidado de honra, procure descobrir locais próximos em que possa ficar com seu parceiro ou seu grupo, porém nunca de modo a perder contacto com os demais convidados e os anfitriões.
Falar em voz alta. Moderar a voz mesmo quando a conversa está animada e o ambiente alegre pode ser difícil, e por isso a voz baixa e a conversa calma e pausada são as melhores provas de que uma pessoa é educada e distinta. Alterar a voz para falar com quem está em outra mesa ou em outro cômodo é um desrespeito para com os demais, incomoda os que estão por perto, e constrange e incomoda inclusive o parceiro distante e por isso é uma das coisas a serem evitadas.
Namoro. Não namore em uma festa. Seja atencioso com todos e dê liberdade a sua namorada ou namorado para entrar em alguma roda de conversação que possa interessar a ela ou ele.
Interrupção. Este é um vício da conversação muito comum, sem que as pessoas que o têm se deem conta de que são “interrompedoras” crônicas. O hábito de cortar o que o outro diz com um aparte que quebra a linha do seu pensamento deve ser evitado. Apartes simpáticos são os que ajudam o outro a desenvolver com mais fluidez a sua exposição.
Se foi interrompido(a), volte ao ponto em que estava somente se achar que vale a pena, e se o assunto lhe interessa de modo particular, e não para deixar claro que não gostou da interrupção forçada.
Participação na conversa. Obviamente, não é bom conversar sobre assuntos que nem todos entenderiam. Se precisar abordar um assunto particular com alguém do grupo, explique aos demais de que se trata. Do mesmo modo, para continuar uma conversa depois de interrompida pela chegada de alguém ao grupo, é necessário fazer, para o recém-chegado, um resumo do que foi discutido antes de sua chegada. Há uma marcada diferença entre assuntos que interessam às mulheres e os assuntos que interessam aos homens, quando se considera a generalidade desses interesses. Há uma diferença ainda mais marcante, com respeito aos mais jovens, em relação às pessoas maduras e aos velhos. Porém um velho pode facilmente reter um jovem em uma conversação, por que sua experiência da vida pode ser fascinante para alguém inteligente que deseja aproveitar todas as pistas para vencer na vida. Fale com uma mãe sobre os filhos dela, pois é o assunto que as mães nunca desprezam.
Crianças. Se você visita uma casa que tem crianças, procure logo de início despertar sua simpatia, pois as crianças são muito críticas e pregam peças ou fazem alguma coisa para atrair atenção que pode ter consequências embaraçosas para você.
Assuntos desagradáveis. Certos assuntos também devem ser evitados ou pelo menos abreviados. A conversa sobre acontecimentos desagradáveis, quaisquer que sejam, deve ser evitada ou, se for inevitável, que seja resumida. Conversar prolongadamente sobre alguma adversidade, além de contribuir para um certo abatimento moral no ambiente, também pode acabar por fazer as pessoas tentarem relaxar usando de humor negro e piadas de mau gosto sobre o acontecido. Também deve ser resumida ao mínimo indispensável a conversa sobre assuntos ligados à profissão dos interlocutores: não falar de política com um jornalista, ou de doenças com um médico, ou de ações com um corretor da bolsa; de educação com um pedagogo, ou de filosofia com um filósofo.
Controvérsias. Não levantar disputas e participar de discussões inflamadas. Evite levar adiante pontos de vista controversos. Temas religiosos e políticos são temas para proselitismo, para púlpito ou palanque, e não para conversa social. Evite também questões objeto de preconceito como a da homossexualidade, do racismo, origem familiar, sotaque regional, etc. Se alguém é enfático ao argumentar contra os seus pontos de vista, não diga nada; ou murmure uma palavra neutra; ou no máximo diga que está a se esforçar por encontrar um ponto de acordo. No entanto, mantida a calma, pode ser uma boa oportunidade para ouvir opiniões sobre suas ideias e posições na matéria. É importante lembrar o efeito que tem o café servido nas reuniões: pode levar a pessoa a excitação no falar.
Sarcasmo. A pessoa espirituosa e bem humorada é um tipo de convidado sempre desejável. Porém, todo excitamento pode resultar desagradável: há o risco de cansar os ouvintes com um excesso de ditos espirituosos. A pessoa bem humorada pode passar seu bom humor ao grupo, alegrar a roda de conversação e influir para o bom êxito de uma festa. Mas, muita vivacidade é inconveniente, pode levar a exageros, a espirituosidade facilmente deriva para a ofensa. Um dito humorístico pode atingir o amor próprio do interlocutor. Não me recordo onde li essa expressão, mas concordo com ela: algumas pessoas são espirituosas compulsivas e preferem perder um amigo a perder a oportunidade de fazer uma piada.
Inferioridade. Subserviência e rasgada manifestação de admiração devem ser evitados. Lembra Cavaleiro, no livro The laws of etiquette, by a gentleman (1836, p. 60) que Nil admirari, o preceito do estoicismo, é o preceito para a conduta entre cavalheiros. É desagradável, para o próprio homenageado, um excesso de homenagens que partem de um indivíduo insistentemente adulador.
Superioridade. O oposto é igualmente um erro: Conduzir a conversa com superioridade sobre o interlocutor, manifesto no pouco interesse por suas opiniões, por não lhe dar oportunidade de falar, e outras atitudes que inibem e constrange o outro. Frases enigmáticas ou em outra língua, muitos jargões estranhos, podem ser um expediente para afastar alguém menos entendido do assunto, e fazer que deixe o grupo. Embora seja necessário distinguir pessoas relativamente “mais importantes” em um evento social, a recíproca não é aceitável, ou seja, que existam pessoas “menos importantes” que a média dos convidados. Ao perceber que não está no grupo certo, afaste-se sem rancor.
Jactância. Algumas pessoas não resistem a qualquer oportunidade de nomear as pessoas importantes que conhece ou com quem falou; outras desejam revelar quanto ganham no emprego ou no seu negócio, quanto a sua aposentadoria é boa, e chegam a exibir seu contracheque para provar suas rendas. Para por um fim ao assunto sem ofender a pessoa, pode ser feita uma observação curta, como “Sua área sempre foi bem paga!” e tentar mudar de assunto prontamente.
Curiosidade. Em uma conversa, evitar excesso de curiosidade. Não se pergunta pelo preço de nada que pertença aos interlocutores. Perguntas diretas como “O que você faz desde que se aposentou?” “Seu filho já passou no vestibular?” “Qual a sua idade?”, “Em que bairro você cresceu?”, “Fez cirurgia plástica?” “Qual sua ocupação?” “É casado?” “Solteiro por opção?” “Quantos filhos tem?…Porque só um?” e outras semelhantes podem causar embaraço e por isso nunca devem ser formuladas. Uma pergunta é mais elegante se disfarçada em uma afirmação que é, ao mesmo tempo, também inquisitiva, como, por exemplo: “Espero que você esteja satisfeito em conhecer Brasília”.
Escolhendo as palavras. Os autores de livros sobre Boas Maneiras sempre insistiram em que uma pessoa educada, referindo-se a uma mulher, usará a expressão “senhora”. Mas, ao falar da mulher, o marido deverá chamá-la “minha mulher”, nunca “minha senhora” ou “minha esposa”. No entanto, uma outra pessoa haverá de referir-se à mulher do outro como tua ou “sua senhora” ou “esposa” evitando-se “mulher”. São expressões demasiado simplórias e devem ser evitadas, mesmo na conversa coloquial, aquelas como “minha patroa”, “minha velha”. Para a mulher, o uso comum é “meu marido”, ou teu ou “seu marido”. Porém, no tratamento cerimonioso, devem ser observados os pronomes de tratamento adequados.
Toda expressão de gíria, palavras ou frases, devem ser evitadas, principalmente aquelas que cheiram a velharia e épocas passadas: “venha passar mal comigo”, empregada como convite para uma refeição, “mas que abacaxi!”, referindo-se a um contratempo, “ele é macaco velho!”, e outras do gênero.
Pontuações da conversa como: Tá? Colou? Tá bom? Legal!… desagradam aos ouvidos, por não conterem um mínimo de respeito à sensibilidade das pessoas. Observações tais como “Puxa, você está pálido!” “Você está com cara de doente!” Você está derrubado! esfriam o animo do interlocutor. Palavrões, piadas e anedotas de conteúdo moral discutível deixarão o anfitrião ressentido, se ele investiu em receber seus convidados segundo o melhor padrão cultural que pode oferecer.
Algumas pessoas têm o hábito de elas mesmas levantarem dúvidas sobre detalhes daquilo que estão falando. Detalhar um assunto já é coisa que provoca tédio, e isto agravado por uma desnecessária procura de exatidão no que diz (“Será que estou certo? Não, não foi bem assim. Ao contrário, eu…”), torna a conversa insustentável. Expressões como “Por que você não…?”; “Sim, mas…!”; “Eu não sei o que fazer!” povoam as conversas sustentadas por um falso interesse das partes.
É muito importante a pessoa dispor de um elenco de frases para utilizar quando precisa ganhar tempo para pensar uma resposta, mas expressões como “Espera aí…”, “Como é que é?”, “Dá um tempo!”, deveriam ser substituídas por outras menos rudes, como, por exemplo: “É interessante o que você diz, e merece reflexão”. “Este é um novo ângulo da questão; é preciso examiná-lo.”
Efeito dos elogios. Pontuar a conversa com elogios simples e inteligentes, feitos a cada um dos interlocutores, anima a conversação. Porém, é lugar comum elogiar gravatas, blusas e vestidos, e isto influi relativamente pouco no ânimo da pessoa elogiada. Elogio a vestimentas e adereços, só quando a pessoa está a ousar muito, o que significa que ela receberia com prazer especial a confirmação do êxito de sua audácia. Ao elogiar a comida, basta dizer que está saborosa, avançar para pedir a receita como prova da sinceridade do elogio é impróprio para o momento, pode ficar para depois, por telefone. Passar elogios a uma pessoa, que tenham sido feitos por terceiros, é uma forma muito poderosa de estimular alguém. Ao contrário, nunca se deve transmitir indelicadezas ouvidas de terceiros, você de certo modo estará se incluindo na autoria da ofensa. Se é você a pessoa elogiada, receber a manifestação com evidente prazer, concordar e agradecer, porém de modo contido.
Estar bem informado. Afirmações inseguras sobre um fato importante de qualquer natureza, pontuadas por “parece que” ou “eu acho que”, introduzem na conversa um momento de indefinição desagradável, de falta de objetividade capaz de congelar a conversa e por isso afirmações inseguras devem simplesmente ser evitadas.
Outras impropriedades. São condenáveis ainda e obviamente: a vulgaridade, a superficialidade, a ênfase exagerada, comentários indiscretos, a afetação, a repetição da mesma história.
Psicologia. A conversação nunca é apenas uma troca de informações, uma vez que as pessoas reagem com emoção às informações trocadas. Devido à riqueza de emoções de um diálogo, os temas repetidos na conversação são um meio excelente para a pessoas conhecerem um pouco de sua própria personalidade e daquelas com quem conversarem. A esse propósito, convidaria o leitor a uma visita à minha página sobre Análise Transacional.
Higiene. Na conversação a proximidade em que estão as pessoas torna importante que certos aspectos da higiene pessoal sejam cuidados, por serem fatores que poderão isolar uma pessoa. O principal deles é o mau hálito ou halitose. A limpeza e o cheiro da pessoa não são menos importantes e devem estar permanentemente cuidados.
Rubem Queiroz Cobra
Página lançada em 00-00-2001.
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Para citar este texto: Cobra, Rubem Q. – Conversação. Site www.cobra.pages.nom.br, Internet, Brasília, 2001.