Hoje: 03-12-2024
Página escrita por Rubem Queiroz Cobra
Site original: www.cobra.pages.nom.br
Galileu Galilei, pioneiro da matemática aplicada, da física e da astronomia, nasceu em Pisa, a 15 de fevereiro de 1564, filho de Vincenzo di Michelangelo Galilei, um músico que fazia experiências com cordas instrumentais buscando comprovação de suas teorias musicais, e Giulia di Cosimo di Ventura degli Ammannati da Pescia. Foi educado no mosteiro de Vallombrosa, perto de Florença, cidade onde sua família se fixou em 1574.
Galileu entrou para a universidade de Pisa em setembro de 1581, para estudar medicina. Preparou-se para medicina por quatro anos (1581-84). Em fevereiro de 1582 o Papa Gregorio XIII, com a Bula “Inter Gravissimas” promulga a reforma do calendário com efeito a partir de 4 de outubro, que passaria a ser 15 de outubro.
Em 1583, observando a oscilação de uma lâmpada na Catedral de Pisa, Galileu descobriu o isocronismo pendular. Durante as férias iniciou o estudo da geometria sob a direção de Ostilio Ricci, de Fermo, mestre que servia na corte toscana. Mas em 1585, por falta de recursos, interrompeu o curso em Pisa e voltou a Florença. Lecionou na academia florentina e em 1586 publicou um ensaio descrevendo a balança hidrostática, invento que tornou seu nome conhecido na Itália. Em 1587 faz sua primeira viagem a Roma.
Em 1589 realizou algumas experiências e demonstrações sobre o centro de gravidade dos sólidos, o que lhe valeu passar a lecionar matemática na universidade de Pisa. Nos anos 1590 e 1591 realizou seus famosos experimentos sobre a queda livre dos corpos e a gravidade, segundo a tradição efetuadas do alto da Torre de Pisa. Fez imprimir o opúsculo Le Operazioni del compasso geometrico et militare. Em 1592 conseguiu ingressar na universidade de Pádua, da República de Veneza, como professor de geometria euclidiana e astronomia aristotélica para estudantes de medicina que precisavam dessa disciplina como base para a prática médica da astrologia, e lá ficou 18 anos.
Em 1609, teve notícia da invenção do telescópio pelo holandês Zacharias Janssen, efetuada em 1608, e imediatamente interessou-se em aperfeiçoar o instrumento. No mesmo ano construiu seu telescópio em Pádua, duplicando a capacidade de aumento do aparelho, e começou em fins de 1609 a realizar com ele suas observações astronômicas. Do alto do campanário de São Marco mostrou a alguns venezianos o funcionamento de sua luneta, a qual ofereceu ao governo de Veneza, salientando a importância do instrumento no campo marítimo e bélico e foi confirmado professor vitalício de matemática na universidade de Pádua com expressivo aumento de salário.
Em janeiro de 1610 descobriu os quatro satélites de Júpiter e escreve sobre as montanhas da lua. Batizou os quatro satélites “Astri Medicei” em homenagem à casa reinante em Florença. Anunciou ao mundo suas descobertas astronômicas no opúsculo Sidereus Nuncius, publicado em Veneza em maio de 1610, no qual descrevia o aspecto montanhoso da superfície lunar, revelava a existência de inúmeras estrelas até então desconhecidas e mostrava que Júpiter possuía quatro satélites. Estas descobertas desacreditavam o sistema ptolomaico da astronomia de então, pois acreditava-se que os corpos celestes descreviam órbitas circulares uniformes ao redor da terra, e eram compostos exclusivamente de um elemento, o éter, e eram, consequentemente, homogêneos e perfeitos. O movimento dos astros era tido como “natural”, não tinha agente externo, pertencia ao corpo, e também uma força não atuava à distância mas somente por contacto e os corpos possuíam peso como parte de sua essência e sua “atualização”. Buscava-se, de acordo com a filosofia de Aristóteles, conhecer a “essência imutável do real”. A física era a ciência descritiva das qualidades de uma coisa por simples enumeração de todos os particulares.
Apesar de que o senado Veneziano lhe havia dado cátedra vitalícia em Pádua, em 1610 Galileu deixou a universidade para ficar em Florença, servindo como matemático e filósofo a corte do grão-duque da Toscana, Cosimo II de Médici, o que lhe dava mais tempo e recursos para experiências. Ele havia batizado Sidera Medicea (Estrelas dos Médicis) os satélites descobertos, em homenagem ao grão-duque que fora seu aluno e agora seria seu patrono.
Em 1611 foi a Roma fazer demonstrações do telescópio para as autoridades eclesiásticas. Devido ao seu talento para expor suas ideias, Galileu tornou-se rapidamente conhecido e discutido na Itália, e muitos peritos eclesiásticos em doutrina ficaram de seu lado. Outros porém viam na sua tese uma destruição da perfeição do céu e uma negação dos textos bíblicos. Os professores aristotélicos uniram-se contra ele, e com a colaboração dos dominicanos, que fulminavam sermões contra os “matemáticos”, secretamente o denunciaram à inquisição por blasfêmia.
Em meados de 1612 publicou em Florença o Discorso intorno alle cose che stanno in su l’ acqua (“Discurso sobre as coisas que estão sobre a água”), no qual ridiculariza a teoria aristotélica dos quatro elementos sublunares e do éter, suposto componente único dos corpos celestes e responsável por sua “perfeição”.
Em 1613, no pontificado de Paulo V (1605-1621), publicou Istoria e dimostrazioni intorno alle macchie solari (“História e Demonstração sobre as Manchas Solares”), onde apoia a teoria de Copérnico. A descoberta das manchas solares foi criticada violentamente pelos teólogos, que viam na tese de Galileu um audacioso e pertinaz confronto com a religião. Na ocasião Galileu escreveu uma carta para seu aluno Benedeto Castelli, afirmando que as passagens bíblicas não possuíam qualquer autoridade no que diz respeito a controvérsias de cunho científico; a linguagem da Bíblia deveria ser interpretada à luz dos conhecimentos da ciência natural. Essa carta começou a circular em inúmeras cópias manuscritas e a oposição ao autor cresceu progressivamente. Assustado, o cientista escreveu cartas explanatórias ao grão-duque de Toscana e às autoridades romanas. Disse que seria um grande prejuízo para as almas, se o povo descobrisse, através de provas, que aquilo em que era pecado acreditar era verdadeiro. Foi a Roma dar pessoalmente explicações. As autoridades, contudo, limitavam-se a instruí-lo para que não defendesse mais as ideias copernicanas do movimento da Terra e estabilidade do Sol, por serem contrárias às escrituras sagradas. Pareceu ao Cardeal Roberto Belarmino, influente teólogo da ordem jesuíta, que era necessário evitar escândalos que comprometessem a luta dos católicos contra os protestantes. Num ato de consideração, o Cardeal concedeu uma audiência a Galileu e informou-o de um decreto que seria promulgado declarando falso e errôneo o copernicanismo, e que ele não devia nem sustentar nem defender tal doutrina, embora ela pudesse ser discutida como suposição matemática. O Papa Paulo V declarou a teoria falsa e errônea pouco depois, em 1616.
Em 1617 Galileu escreveu uma obra sobre a superioridade da fé católica, que teve o interesse dos papas Paulo V e Gregório XV. Este último inspirou-se nela para instituir a congregação da Propagação da fé (De propaganda fide).
Durante alguns anos Galileu permaneceu em silêncio. Os sete anos seguinte viveu em Bellosguardo, próximo a Florença. Ao fim desse tempo, em outubro de 1623 ele respondeu a um panfleto de autoria de Orazio Grassi, sobre a natureza dos cometas, com a obra Saggiatore, na qual expunha sua ideia de método científico e dizia que o livro da natureza está escrita em letras matemáticas. A obra foi dedicada ao novo Papa, Urbano VIII, seu amigo, que recebeu a dedicatória com entusiasmo.
Em 1624, já falecido o Cardeal Belarmino, Galileu volta a Roma, para pedir a Urbano VIII (1623-1644), a revogação do decreto de 1616. Apenas conseguiu uma licença do papa para discutir os dois sistema, Ptolomaico e Copernicano, imparcialmente, colocando no final uma nota que lhe foi ditada: que o homem não pode pretender conhecer como o mundo é feito de verdade… porque Deus podia chegar aos mesmos efeitos por caminhos não imaginados por ele. Feito este acordo, voltou a Florença e escreveu, em 1632 o Dialogo sopra i due massimi sistemi del mondo tolemaico, e copernicano (“Diálogo a respeito dos dois maiores sistemas: Ptolomaico e Copernicano”).
Porque nenhum editor desejava correr maiores riscos, apesar do imprimatur garantido dos censores, “O Diálogo” de Galileu somente é publicado em Florença em 1632, ainda sob Urbano VIII e foi recebido com aplauso em toda a Europa como um obra prima de literatura e filosofia. O trabalho, porém, não respeitava a imparcialidade requerida: era inteiramente favorável ao sistema de Copernico. Então foi colocado para o Papa que, apesar do titulo neutro, o trabalho era inteiramente favorável ao sistema Copernicano, o que fazia inútil o texto final exigido no acordo feito com o autor. Os Jesuítas insistiram que o livro teria piores consequências sobre o sistema de ensino que Lutero e Calvino colocados juntos. O papa, irritado, ordenou o processo inquisitorial. Em outubro do mesmo ano o autor foi convocado para enfrentar o tribunal do Santo Ofício.
Apesar de queixar problemas de saúde e idade, Galileu foi obrigado a viajar para Roma e submeter-se a julgamento. Foi julgado culpado de ter adotado e ensinado a doutrina copernicana e condenado em junho de 1633. Foi no entanto tratado com indulgência e não foi colocado na prisão. Obrigado a abjurar suas teses sob pena de ser queimado como herege, Galileu recitou uma fórmula em que renegava, amaldiçoava e repudiava seus erros passados. O Papa reduziu a pena a prisão domiciliar, que durou o resto de sua vida.
Galileu continuou, no entanto, a trabalhar secretamente ainda sob Urbano VIII (1623-1644), e em junho de 1635 o príncipe Mattias de Medici levou os originais do Discorsi e dimostrazioni matematiche intorno a due nuove scieze attenenti alla meccanica et i movimenti locali (“Discurso a Respeito de Duas Novas Ciências”) contrabandeados da Itália para serem publicado em Leiden, na Holanda em 1638. Nessa obra, que seria a mais madura de todas que escreveu, Galileu mostra que o verdadeiro caminho para o conhecimento da natureza é a observação dos fenômenos tais como ocorrem e não como os explica a pura especulação; recapitula os resultados de suas primeiras experiências em Pisa e acrescenta algumas reflexões sobre os princípios da mecânica; essa obra. Idealizou a aplicação do pêndulo aos relógios, invento que, por mediação de Mersenne, o cientista holandês Christiaan Huygens pôs em prática em 1656.
Aos poucos Galileu perdeu a visão em conseqüência de suas experiências com a luneta. Ele ditava a dois discípulos Vicenzo Viviani e Evangelista Torricelli suas ideias, quando veio a adoecer para morrer em Arcetri, perto de Florença, a 8 de janeiro de 1642. Suas descobertas, foram resultado de uma nova maneira de abordar os fenômenos da natureza e nisso reside sua importância dentro da história da filosofia.
Rubem Queiroz Cobra
Página lançada em 00-00-1997.
Para citar este texto: Cobra, Rubem Queiroz – NOTAS: Vultos e episódios da Época Moderna. Site www.cobra.pages.nom.br, Internet, Brasília, 1997.