Hoje: 21-11-2024
Página escrita por Rubem Queiroz Cobra
Site original: www.cobra.pages.nom.br
O pensamento se faz de intuições conceituais ou ideias, consecutivas, sequenciais: as intuições conceituais ou ideias são momentos do pensamento.
Dissemos que as intuições conceituais são possíveis desde que haja uma experiência prévia de intuições sensíveis. Sons e imagens tomados de nossa reserva de experiências são os veículos das intuições conceituais. O pensamento se nos apresenta então como uma composição sonora, feita de frases e para sua composição amiúde consultamos nossas reservas de imagens, como quando desejamos reconstituir um ambiente que visitamos, uma paisagem vista, etc.
Portanto, ao pensar, o indivíduo “ouve” seu pensamento, que é auxiliado com o que ele pode imaginar, pode ver em sua mente. Um cego que nunca teve a experiência de ver não tem como utilizar imagens enquanto pensa, do mesmo modo que a pessoa que vê. A pessoa que não fala nem ouve, mas vê, não utiliza o som de palavras em seu raciocínio ou em seus sonhos, mas sinais visuais que incluem o alfabeto visual dos surdo-mudos.
O pensamento é um arranjo de conceitos que estão organizados segundo variadas sintaxes. É um continuum cuja dinâmica é essencial à sua finalidade de se constituir em uma proposição e alcançar a estrutura de um juízo ou intuição conclusiva.
Eis que o pensamento corresponde, portanto, a uma corrente de configurações associativas elas mesmas incognoscíveis, mas que vão exprimir-se engendrando na mente sequências de intuições sensíveis como palavras e imagens conforme a sintaxe associativa pertinente. Assim se constroem as proposições de certeza, de dúvida, de relação de causa e efeito, de conjectura, de todos os tipos de sintaxe que a mente dispõe para reunir ideias em pensamentos.
O sistema associativo biológico tem um controle que se pode dizer eletro-químico. Os sinais que o atingem fazem com que sua própria fisiologia dê origem ao impulso para o seu movimento associativo. O pensamento é, portanto, em primeiro lugar espontâneo. Mas, porque registra o sistema suas intuições conclusivas, os juízos, o pensamento pode criar novos conceitos que passam a ser causa de uma forma diferente de pensamento que é o raciocínio. O raciocínio chega ao fim que é pedido pela sintaxe associativa mediante uma série de esforços sucessivos de ajustamento, de aproximações sucessivas, que consistem em se ir colocando proposições que vão sendo descartadas ou melhoradas, substituídas por outras novas teses ou afirmações e assim até chegar a abranger por completo a realidade do objeto e por conseguinte, dessa maneira, obter o resultado final ou conceito do fechamento final.
Em síntese com o espírito, o encaminhamento aquisitivo biológico que busca o conforto da adequação sintáxica associativa, é coincidente com o movimento próprio do espírito no conhecimento, no sentido do aumento da intimidade, ao mesmo tempo ampliando sua posse no sentido da totalidade, na condição de seu aprazimento.
Existe portanto um conhecimento final que é o fechamento da configuração mas, sobretudo, existem as inúmeras linhas de raciocínio em cada uma variando a fisiologia e os sentimentos que essa gera. O processo não deixa de ser o mesmo próprio da mente orgânica, mas alguma influência existe que implica aceitação de um certo curso de pensamentos ou sua recusa, ou o esforço evocativo, ou o acionamento do esforço reflexivo. O que ordinariamente chamamos querer e vontade corresponde à consciência desses impulsos conforme o sentimento de adequação que nos encaminha para um certo desfecho.
Nossa razão é essencialmente um processo de síntese, de união dentro de uma sintaxe que organiza a associatividade de elementos segundo uma finalidade e por isso todos os passos desse processo são lógicos em relação a esse fim.
Essas sínteses encaminham para a descoberta de novos detalhes, que por sua vez pedem novas sínteses, e ao mesmo tempo que cada pormenor é em si mesmo uma síntese. E a síntese dessas sínteses dá as razões fundamentais que se aplicam concomitantemente no sentido do todo mais completo, e do mais ínfimo e mais íntimo.
Essa capacidade de síntese e de intimidade se manifesta nas experiências de consciência ininterruptamente. Esse progresso para a intimidade e a totalização, continuamente e em contínuo avanço, ultrapassa os limites da experiência, valendo-se do próprio material reincorporado como coisa pensada e coisa sentida, material que chamo, sem nenhuma hesitação, transubstanciado, aquilo que foi experiência de consciência e se insere no sistema associativo com a marca do sentimento de adequação ou inadequação vivida naquela experiência. A totalização vai tendendo para um ideal, fora da realidade, para além do limite do cognoscível.
A associatividade produz um objeto possível segundo os dados armazenados no sistema e que, se existisse, seria a resposta para as questões extremas de causa e efeito com que se debate o sistema, seria o segmento físico que fecharia o sistema. E então esse processo natural tenta chegar por necessidade própria a unidades que abranjam absolutamente a totalidade do sintetizável, do unível. Então cria como verdades aquelas sínteses totais, Deus, o Universo, o espírito, a liberdade, e todos os objetos de que normalmente se ocupa a Metafísica.
Rubem Queiroz Cobra
Página lançada em 06-12-2009.
Direitos reservados.
Para citar este texto: Cobra, Rubem Q. – O pensamento como corrente associativa. Site www.cobra.pages.nom.br, Internet, Brasília, 2009.