Raimundo de Farias Brito

Hoje: 21-11-2024

Página escrita por Rubem Queiroz Cobra
Site original: www.cobra.pages.nom.br

1 23»

Segundo seu biógrafo Jônathas Serrano, o filósofo Raimundo de Farias Brito nasceu na atual cidade de São Benedito, então um povoado, na serra da Ibiapaba, Ceará, em 24 de julho de 1862 (data fixada em pesquisa feita pelo próprio Jônathas). Foi batizado a 3 de dezembro do mesmo ano na capela de São Benedito, filial da Matriz de Nossa Senhora da Assumpção da Vila de Viçosa (Jônathas Serrano se equivoca interpretando “10bro”. da certidão como “outubro”, apesar de ele mesmo mostrar a certidão de casamento dos pais de Farias Brito onde se vê “8bro”, que equivale a “outubro”, assim como também “9bro” era a abreviatura de “novembro”, e portanto “10bro” seria dezembro, e não outubro. Tão longo prazo entre o nascimento e o batismo se explica, talvez, por não terem as capelas um sacerdote permanente, e com frequência dependerem da visita de um padre coadjutor (como consta da certidão de batismo) ou de “missões”, quando a localidade era visitada por um ou vários padres que ouviam as confissões e realizavam em conjunto vários casamentos e batizados.

O pai, Marcolino José de Brito, natural de Sobral, e a mãe, Dona Eugênia Alves Ferreira, natural de Serra dos Cocos, eram gente humilde habituada à lide do campo. Quando Raimundo contava apenas três anos, sua família transferiu-se para um sítio chamado Alagoinha, a cinco léguas de Ipú, onde moravam parentes de sua.mãe. De lá muda-se, em 1870, para Sobral, onde a família abre uma pequena quitanda e Raimundo fez seus estudos primários, matriculando-se depois no Ginásio Sobralense onde se destaca no estudo de francês, latim e matemática.. De volta a Alagoinha em fins de 1976, ao que parece pela impossibilidade de se sustentar em Sobral, a família perdeu quanto possuía por causa da seca de 1877. No ano seguinte a família emigra para Fortaleza, a pé, levando num burrico os trastes que ainda possuía. Na capital cearense Raimundo cursou os estudos secundários no Liceu Cearense, e conseguia algum dinheiro ministrando aulas de matemática. Concluiu seus estudos em 1880 e, no ano seguinte, contando Farias Brito 18 anos, a família, mudou-se para Pernambuco. Diz ainda Jônathas Serrano que essa viagem foi custeada com a venda das últimas pequeninas joias de ouro que ainda restavam a Dona Eugênia, a mãe do filósofo.

Em Recife o pai conseguiu com o conterrâneo padre diretor do Ginásio Pernambucano o emprego de porteiro do estabelecimento. A mãe fornecia refeições a estudantes e engomava roupa, e um irmão trabalhava em uma charutaria.

De 1881 a 1884, Farias Brito cursou a Faculdade de Direito, que, desde 1,854 funcionava no velho prédio da rua do Hospício, onde se conservou até 1882. Farias Brito teve ensejo de assistir, durante o seu curso, à mudança para o prédio da Praça então chamada Pedro II, hoje Dezessete, no Bairro de Santo Antônio. Nesse último endereço permaneceu até 1912.)

Em 1879, havia sido instituído o ensino livre nas faculdades de Direito, isto é, abolida a obrigatoriedade da frequência dos alunos e admitida a prestação de exames feitos por matérias. Este novo regime certamente facilitou os estudos de Farias Brito, que lecionava matemática em alguns colégios, como já o fizera em Fortaleza. Na Faculdade de Direito, foi um de seus alunos mais distintos e lá conheceu o influente Tobias Barreto, o líder da corrente que na filosofia no Brasil ficou conhecida como a “Escola do Recife”, e que no segundo e no terceiro ano de seu curso fez parte da banca que o examinou.

Colado o grau em 1884, Farias Brito obteve, quando ainda no Recife, uma nomeação de promotor público no Ceará, cargo em que tomou posse em Viçosa, no interior daquele Estado, em 1885. Um caso em que obteve a condenação do réu ao qual se diz que o juiz pretendia favorecer com a liberdade, foi causa de estremecimento entre as duas partes, levando Farias Brito a solicitar sua transferência para Aquiraz, onde permanece até 1887.

É de 1887, época em que está em Aquiraz, um artigo de Farias Brito sobre o suicídio aparece na publicação quinzenal de um club literário de Fortaleza. Comenta Jonatas Serrano que nesse artigo ele demonstra o espírito evolucionista e materialista da Escola do Recife (fundamentado em Darwin e Spencer e grandemente promovido por Tobias Barreto), admitindo que um criminoso possa ser originariamente mau. Aponta o trabalho como uma força consciente e regeneradora, dizendo “A fórmula da moderna civilização deve portanto ser esta: trabalhemos. Tal é a única medida de salvação contra a influência perniciosa do pessimismo”.

Neste período como promotor, Farias Brito escreveu versos, depois coligidos no livro “Cantos Modernos”. Farias Brito mais tarde repudiou esse seu trabalho da juventude, como de escasso valor, exceto pela sua Introdução na qual indaga: “A Poesia ainda tem razão de ser?”. Esse trecho ele levou para um capítulo de “Finalidade do Mundo”, que publicaria mais tarde.

Em 1888 o novo presidente da Província do Ceará, Antônio Caio da Silva Prado, ouvindo em Aquiraz um discurso do promotor Farias Brito, convidou-o para Secretário de Governo. Vindo a falecer Caio Prado um ano depois, Farias Brito dedicou-se a advocacia e ao ensino, tendo feito concurso para o Liceu Cearence. Em 1890, concorreu então a deputado ao Congresso Constituinte representando o Estado no Congresso nacional, sem êxito. Frustrado com o resultado, Faria Brito dedicou-se à advocacia e publicou seu primeiro livro, Contos Modernos, de poemas, em 1889. Eleito novo governador da província em 1891 pelo congresso da província o general de divisão José Clarino de Queiroz, este o convidou para secretário. Esta experiência no governo foi ainda mais frustrante. Presenciou então as arruaças da revolta de fevereiro de 1892 contra este último governador, na onda de distúrbios com origem na política do Marechal Floriano Peixoto e executada pelos alunos da Escola Militar de Fortaleza, que bombardearam com canhões o palácio da Luz, sede do governo.

Em setembro de 1891 defendeu tese e se submeteu às provas de arguição e preleção para a cadeira de História Geral do Liceu do Ceará, onde então ja lecionava interinamente havia dois meses. Foi por essa ocasião que escreveu uma pequena monografia sobre os Fenícios e Hebreus, em sintonia com o ensino que ministrava.

No triênio de 1892-1895, um período tranquilo em sua vida, elabora, redige e publica o primeiro dos volumes da Finalidade do Mundo: A Filosofia como Atividade Permanente do Espírito (1895) enquanto também escreve artigos para jornais e revistas em Fortaleza.

Em Dezembro de 1893 Farias Brito casou em Fortaleza, na Igreja Coração de Jesus, com Ana Augusta Bastos, filha do comerciante João da Costa Bastos. Após o lançamento do livro, o filósofo sofre um grande golpe: seu primeiro filho, Raimundo, não chegou a completar um ano – morreu com apenas dez meses de idade. No início de 1897 nasce sua filha Filomena (de Farias Brito Pontes de Miranda), mas em junho do mesmo ano sua esposa veio a falecer.

Em 1899 publicou o segundo volume do Finalidade do Mundo: Filosofia Moderna.

Em 1901, talvez no intuito de desanuviar os espírito, Farias Brito e o pai de sua falecida esposa, o comerciante João da Costa Bastos, pensaram viajar à Europa. Na verdade pouco motivados, o seu sogro desistiu da viagem quando o vapor atracou no Recife, e Farias Brito, tendo prosseguido até o Rio, lá encheu-se de preocupações com o pai idoso, e decidiu também voltar ao Ceará. Encontrou o pai enfermo, vindo este a falecer poucos dias depois, aos 71 anos de idade .

Em setembro do mesmo ano de 1901, Farias Brito casou Segunda vez com Annanélia Alves, natural de Guaramiranga, vinte anos mais jovem que ele.

A morte do pai e os desgostos políticos, segundo Jônathas Serrano fizeram com que Farias Brito deixasse o Ceará. Em 1902 passou a residir em Belém do Pará, à rua João Diogo, à Travessa 22 de Junho, vivendo aí sete anos de intenso trabalho como professor substituto na Faculdade de Direito e promotor público até 1905, quando solicitou exoneração deste último cargo, passando a advogar. Lá nasceram três de suas filhas do segundo casamento: Margarida Maria (de Farias Brito e Castro) nascida em 1904, Maria Madalena (de Farias Brito Mendonça) em 1906, em Belém do Pará, na casa, canto da rua Boaventura da Silva; e Maria José (Farias Brito Soares).

Em 1902 visitou a capital do Pará o grande pregador belga Padre Júlio Maria De Lambaerd, que entre 1892 e 1903. impressionou com seus sermões a elite cultural de quase todos os estados do país. Radicou-se como missionário, primeiro no Amapá. Chocado com a miséria daquela província paraense, fundou ali uma congregação feminina para cuidar dos doentes. Terminou seus dias em 1944 na Diocese de Caratinga, Minas Gerais, onde trabalhou no combate à pobreza, como assistente de Dom Carloto Távora. Quando esteve em Belém, em 1902, o missionário fez duras críticas ao positivismo, o que provocou veemente reação de um militar positivista fanático, o Major Gomes de Castro, através de artigo publicado em um dos principais jornais da cidade. Ao ler o artigo, Farias Brito, irritado com as grosserias nele contidas, escreveu em defesa do sacerdote de modo moderado porém enérgico.

A terceira parte do Finalidade do Mundo: Evolução e Relatividade saiu em 1905 e, no mesmo ano, A verdade como regra das ações, primeira parte de Ensaios sobre a Filosofia do Espírito.

Em 1909 Farias Brito mudou-se com a família para o Rio de Janeiro, com a intenção de fazer concurso para a vaga de professor de Lógica do famoso colégio Pedro II. Inscreve-se e, além de ter que competir com quatorze outros candidatos, enfrenta preconceitos pela sua origem e o desconhecimento de sua obra, que um concorrente, Manuel de Bethencourt, critica publicamente pela imprensa, obrigando Farias Brito a uma reposta no mesmo ”Jornal do Comércio”.

O resultado foi empate entre cinco concorrentes, entre eles Euclides da Cunha. Dos cinco, embora por votação da mesa Farias Brito tenha sido escolhido para a vaga, o governo, ao qual pertencia o Colégio, escolheu da lista a Euclides da Cunha.

Devido a poucas semanas depois ocorrer, no ápice de um drama familiar, o assassinato de Euclides da Cunha, a vaga foi reaberta e novamente se inscreveu Farias Brito. Foi logo, investido nas funções em caráter interino e as provas reapreciadas por nova banca. Coube a Sílvio Romero examinar os trabalhos de Farias Brito nessa segunda fase, sendo seu parecer inteiramente favorável. Farias Brito foi então nomeado e empossado por decreto ainda em dezembro de 1909.

Depois de começar suas aulas no Colégio Pedro II, Farias Brito publicou A Base Física do Espírito, (1912) segunda parte de Ensaios sobre a Filosofia do Espírito, o qual dedica à congregação dos professores do Colégio, expressando admiração e seu reconhecimento pela justiça que lhe fora feita nos exames.

Nasceram no Rio de Janeiro suas duas filhas caçulas Lucy (Farias Brito Mota) em 1913, e Sulamytha (Farias Brito David).

O Mundo Interior, a última parte da série Ensaios sobre a Filosofia do Espírito é publicado em 1914. Ao longo de sua vida no Rio de Janeiro.

Farias Brito travou amizade com Nestor Vítor, Rocha Pombo e Jackson de Figueredo. Malograda a tentativa que fez de se eleger para a Academia Brasileira de Letras, Farias Brito escreveu, em 1916, o Panfleto, em que extravasa sua frustração em termos estranhos ao seu estilo habitualmente cordato.

A tuberculose, que na época ceifava vidas, atingiu também a família de Farias Brito. Ele próprio faleceu desse mal, O fato de que também sua filha Philomena padeceu desta moléstia. é revelado em cartas de Heráclito Carvalho Pinto, amigo da família, comentadas na biografia daquele advogado escrita por John W. F. Dulles (Univ. of Texas, 2002 ). Filomena era casada com um parente do conhecido jurista alagoano Francisco Cavalcanti Pontes de Miranda. As cartas dizem, em suma, que Philomena Farias Brito Pontes de Miranda, “filha do espiritualista Farias Brito” esteve internada, sob os cuidados do então jovem tisiologista sergipano Milton Fontes Magarão, na Pensão-Sanatório São Geraldo, em Corrêas, próxima a Petrópolis, em 1934.

Farias Brito adoeceu em janeiro de 1917 e faleceu naquele mesmo mês no Rio de Janeiro. O Diário Oficial da União de 20 de julho, em aditamento a publicação de 17 de julho de 1918, registra solicitação de D. Annanélia Alves de Farias Brito do pagamento pela aquisição feita pelo Governo da biblioteca de seu falecido marido, e na data de 21/09/1917, p. 10, Seção 1, pensão do montepio para si e suas filhas.

Raimundo de Farias Brito – Obras

1 23»

Rubem Queiroz Cobra

Página lançada em 04-02-2011.

Direitos reservados.
Para citar este texto: Cobra, Rubem Q. – Raimundo de Farias Brito. Site www.cobra.pages.nom.br, Internet, Brasília, 2011.