Hoje: 21-11-2024
Página escrita por Rubem Queiroz Cobra
Site original: www.cobra.pages.nom.br
O que uma estrutura associativa – um conjunto de células do sistema nervoso unidas por suas sinapses – contem não é um retrato ou uma escultura das coisas; é apenas uma combinação organizada dos sinais recebidos pelo sistema por via das sensações. Essa combinação permite, perante o espírito, a reconstrução mental das coisas como uma experiência de consciência.
Mostrou o estudo da fisiologia do cérebro que, no campo de visão, um objeto que é visto reúne impressões gravadas em uma variedade de células isoladas. Algumas células registram movimento, outras, linhas em uma direção específica; outras, superfícies específicas do objeto; outras as cores; outras as disparidades estereoscópicas, etc. É fisicamente impossível a síntese desses dados de modo que a consciência de um objeto pudesse ser mera leitura, mera “visão” de sua reprodução no cérebro.
Portanto, o objeto da consciência não é o objeto real mas um objeto que se constitui internamente de partes inclusive relativamente remotas. Ao tornar-se a coisa consciente, ocorre uma síntese que integra todos os elementos, seja essa coisa constituída de ideias, de sons, de imagens, etc. Esta síntese não é uma representação única, mas sim uma percepção única que contem inclusive, a reação emocional que a coisa desperta. A esta combinação de dados relativa a um objeto tenho chamado configuração associativa.
Por essa razão, acho que se poderia chamar os objetos que conhecemos de objetos configurados porque não estão na mente como réplicas da realidade, mas como uma representação, na forma de configurações associativas que os dão à consciência como ideias, como conceitos, como projetos, como objetos dos sentidos, enfim, como objetos ideais. E essas configurações se constroem seguindo certas sintaxes naturais com que o sistema associativo está equipado.
As Sintaxes Associativas Do Pensamento. A identidade das coisas depende sempre das interligações de uma síntese, e essa coisa sintetizada, considerada em outra escala maior, entra também na síntese de algo maior, passa a ser um detalhe íntimo, conhecido na análise de uma estrutura superior. Se os elementos do que é visto não encontrassem uma sintaxe associativa de união, de síntese, a coisa não seria conhecida, seus sinais não encontrariam harmonia possível na mente para qualquer grau de percepção. Evidentemente esse conceito de sintaxe associativa tem afinidade com aquilo que, como visto atrás, está no pensamento de Piaget, de Kant, e de Leibniz o primeiro fala de esquemas possíveis, o segundo fala de categorias, e o terceiro, de predisposições. Mas acredito que o conceito de sintaxe como eu o utilizo pode ser ainda mais abrangente, porque não o aplico somente ao pensamento, que é aquilo com o que Piaget e Kant e Leibniz se preocupam, mas também às formulações que conduzem a sentimentos e comportamentos que têm uma origem inconsciente.
A finalidade das sintaxes associativas não se restringe, portanto, apenas a uma função aglutinadora que gera conceitos, como a que tem a sintaxe na linguagem. O poder das sintaxes vai além de sua função organizadora das configurações porque elas também imprimem uma dinâmica à associatividade, promovendo o crescimento da configuração associativa, e imprimindo a esse crescimento um sentido conclusivo, de finalidade, de resultados que podem demandar uma ação. Elas organizam a expansão das matrizes associativas herdadas em novas configurações associativas que registram e associam as vivências do indivíduo e apontam para metas ou objetivos a serem atingidos.
Essas sintaxes, correspondam elas a canais de predisposição já preexistentes ou, como prefiro, a ordens gravadas no DNA, conduzem o pensamento, os sentimentos e os comportamentos segundo as mesmas categorias das matrizes associativas primitivas, os núcleos em que têm sua origem. Em consideração a esse aspecto, prefiro reservar a expressão “Matrizes associativas genéticas” aos núcleos estruturais primitivos que deflagram e coordenam certos comportamentos instintivos desde os primeiros momentos de existência do indivíduo, e a expressão “Agregação associativa” para designar a estrutura que se forma como registro e associatividade das experiências do indivíduo, obediente à sintaxe e como acréscimo à configuração associativa original. Essa agregação depende, portanto, da leitura de afinidades segundo sintaxes específicas, um processo que a ciência ainda deverá esclarecer.
As experiências vividas pelo indivíduo permitem, portanto, uma variedade de novas configurações para comportamentos adicionais e substitutivos aos impulsos primitivos que são acrescidas às matrizes genéticas segundo sua sintaxe. Os núcleos ou matrizes associativas genéticas podem assim comandar, através das sintaxes próprias, a organização de configurações com fechamento associativo sobre objetos necessários à sobrevivência e contendo ordens para comportamentos em relação a esses objetos na modalidade que lhe é própria. As estruturas, nesse caso, criam fisiologias que geram o sentimento de bem estar, o que é válido para todos os animais e, no caso do homem, geram algo mais, que é o sentimento de auto valor ou excelência pessoal e felicidade.
Rubem Queiroz Cobra
Página lançada em 06-12-2010.
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Para citar este texto: Cobra, Rubem Q. – A fundação para a Educação e a Ascese. Site www.cobra.pages.nom.br, Internet, Brasília, 2010.