John van Nostrand Dorr II por L. Barbosa e P. Nogueira com Nota de R. Cobra

Hoje: 19-11-2024

Página escrita por Rubem Queiroz Cobra
Site original: www.cobra.pages.nom.br

Transcrição permitida de um opúsculo de 8 páginas em português e inglês (não consta o autor, nem data, mas reconheceram sua autoria dois ilustres geólogos: Aloísio Licínio de Miranda Barbosa e Paulo de Oliveira Nogueira, ambos de Belo Horizonte).

“John Van Nostrand Dorr 2nd, ou Jack Dorr, será sempre lembrado no Brasil entre os que militam nas Geociências, pela amplitude dos horizontes que abriu à investigação geológica. Seu nome se destacará dentre os de outros norte-americanos que contribuíram para o conhecimento do nosso subsolo em grau comparável ao de Orville A. Derby que dedicou a própria vida ao país, no início deste século.

O ponto de partida da obra de Dorr no Brasil foi a missão recebida do Serviço Geológico dos Estados Unidos, em meados de 1941, de avaliar as reservas de minério de manganês do Morro de Urucum, no então Estado de Mato Grosso. Tratava-se de tarefa importante dentro da conjuntura político-econômica: o Brasil sempre fora grande fornecedor de manganês à siderurgia norte-americana, mas a entrada dos Estados Unidos na Segunda Guerra Mundial já se prefigurava como inevitável e as reservas do Morro da Mina, em Lafaiete, MG, até pouco tempo o maior produtor desse minério no mundo, caminhavam para o esgotamento. Estimativas do Morro de Urucum sugeriam que suas reservas poderiam se tornar vitais, mas o conhecimento das mesmas era escasso, a despeito do trabalho regional de M.A. Lisboa e de uma empresa operar uma mina no local.

Junto com o trabalho geológico de Urucum, Dorr iniciou um relacionamento com jovens geólogos brasileiros, seus coadjuvantes, e foi aos poucos ganhando experiência com o Brasil e os seus costumes, o que, alguns anos mais tarde, passou a orientar sua própria carreira.

Sua grande oportunidade foi o projeto de levantamento do Quadrilátero Ferrífero de Minas Gerais, iniciado e dirigido por ele e, para cuja execução, contribuíram, além de profissionais de outras áreas, mais 17 geólogos, a maioria do Serviço Geológico dos Estados Unidos que participaram por intervalos de tempo variáveis, entre 1947 e 1962. A função de Dorr como geólogo foi sobrecarregada com a de dirigente, coordenador e crítico de um grupo heterogêneo, tarefa que desempenhou com habilidade. O resultado de conjunto aponta para uma problemática científico-econômica que ainda tem muito a ser investigada com proveito, para não mencionar os benefícios práticos imediatos relativos à orientação dada aos operadores das minerações do Quadrilátero.

John Van Nostrand Dorr 2nd nasceu a 16 de maio de 1910 na cidade de Nova Iorque. Até atingir idade adulta, viveu em Nova Iorque, Nova Jersey e na Nova Inglaterra. Filho de família influente e abastada (seu pai foi conselheiro do Presidente Wilson), cultivou o gosto de velejar nas férias, gosto que manteve por toda a vida a despeito de buscar outras emoções como a canoagem e de haver viajado pelo Pacífico, via Canal do Panamá, como tripulante de um petroleiro. Cursou a Universidade de Harvard sem objetivo profissional, bacharelando-se em 1932 em Literatura Inglesa, passando, a seguir, um ano a viajar pela Europa. Empregou-se em uma missão econômica americana na Turquia, quando conheceu sua primeira esposa, Mary Elizabeth Brigham.

Nessa ocasião, descobriu sua vocação para a geologia o que o levou a cursar três anos na Escola de Minas do Colorado e, depois, a trabalhar um ano para uma companhia petrolífera no oeste do Texas. Este, porém, não era o tipo de trabalho que o interessava; deixou-o para ingressar no Serviço Geológico dos Estados Unidos, onde fez sua carreira definitiva. Seus primeiros anos nessa instituição seguiram o quadro normal de um geólogo júnior, sendo orientado por colegas mais maduros em uma diversidade de situações geológicas do oeste dos Estados Unidos e do Alasca, relacionadas a carvão, níquel, tungstênio, além de geologia regional. Foi, assim, se preparando para sua primeira missão no exterior, a saber, o levantamento das reservas de Urucum.

Concluído este último trabalho, os Estados Unidos entraram na guerra e as atribuições de Dorr mudaram, com permanência longa na sede do Serviço Geológico, pontilhada por viagens curtas ao exterior para observação de jazidas in loco. Ao término da Segunda Guerra Mundial sua vida entrou em uma nova fase: divórcio, casamento com Ann Pierce, trabalhos de campo no oeste do país e na Região Ferrífera dos Grandes Lagos e, depois, sua atividade mais extensa no Brasil. Aqui chegou com a esposa e um filho em gestação para iniciar o levantamento da geologia e dos recursos minerais do Quadrilátero Ferrífero, o grande projeto acordado entre o Serviço Geológico do Departamento do Interior dos Estados Unidos e o Departamento Nacional da Produção Mineral do Ministério da Agricultura do Brasil.

Durante a vigência desse projeto, Jack Dorr teve oportunidade de visitar a importante jazida de minério de manganês recém-descoberta na Serra do Navio, no Amapá, a convite do seu concessionário Augusto A. Antunes, o qual, posteriormente, conseguiu apoio financeiro nos Estados Unidos para desenvolver a mina. Também visitou jazidas em várias partes da América do Sul e da Índia, em viagens curtas.

Encerrados os trabalhos de campo no Quadrilátero, Dorr regressou aos Estados Unidos em 1962, tendo sido designado para coordenar os assuntos do USGS relativos a manganês, visitando todas as jazidas nos Estados Unidos e as principais de outras partes do mundo, com exceção da Austrália. Jack Dorr publicou mais de 50 trabalhos científicos, merecendo destaque suas publicações pelo USGS e os artigos em Economic Geology sobre geologia e recursos minerais do Brasil, além dos trabalhos apresentados nos Congressos Geológicos Internacionais do México e da Escandinávia. Seus Professional Papers sobre o distrito de manganês e ferro de Urucum, de 1945, e sobre os levantamentos feitos no Quadrilátero Ferrífero, de 1969, são dois clássicos da literatura internacional sobre as chamadas formações ferríferas bandadas.

Ao se aposentar do USGS, em 1975, Dorr passou um breve período como geólogo consultor no Brasil e alhures seguido de um ano de lazer em que velejou entre o Maine, Flórida e as Bahamas. Nos anos seguintes, viveu nos arredores de Washington D.C., intercalando viagens à América do Sul e à Europa. Tinha prazer em ser um “globe- trotter” que havia molhado os pés em quase todos os oceanos. Orgulhava-se do sucesso profissional de sua mulher, Ann Pierce, educadora na área de recursos naturais, bem como de seus três filhos.

Tendo vivido no Brasil durante um tempo em que a profissão de geólogo se estruturou, Dorr estimava que a profissão de geólogo se estruturou, Dorr estimava que sua participação nesse processo fora um ponto alto de sua carreira. O levantamento do Quadrilátero Ferrífero deu oportunidade de estágio a muitos estudantes, enquanto jovens docentes e técnicos de institutos universitários foram encaminhados para bolsas de estudos do USGS em universidades americanas. Por outro lado, a nascente Sociedade Brasileira de Geologia teve seu total apoio, tendo a equipe de Dorr, na época, criado o seu Núcleo de Minas Gerais. Seus debates com geólogos de prestígio no meio educacional foram fonte de sugestões para a implantação dos cursos de geologia no país.

Jack Dorr foi membro das seguintes sociedades profissionais: American Association of Petroleum Geologists; Society of Economic Geologists; Geological Society of America; Sociedade Brasileira de Geologia e do seu Núcleo de Minas Gerais, Geological Society of India; Geological Society of Washington, D.C.; IAGOD, tendo pertencido à diretoria de algumas delas. Foi também sócio do Kosmos Club de Washington D.C..

Recebeu os seguintes prêmios em sua carreira profissional: Diploma de Honra-USOM, 1956; Diploma de Honra- Internacional Cooperation Administration, 1959; Medalha Tiradentes do Governo do Estado de Minas Gerais; Medalha José Bonifácio da Sociedade Brasileira de Geologia, 1964; Doutor Honoris Causa da Universidade Federal de Minas Gerais, 1966, e Diploma de Honra do USGS.

John Dorr morreu em 23 de dezembro de 1996, em Bethesda, Maryland.”

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NOTA: Porque foi uma pessoa que influiu diretamente em minha carreira profissional, que me demonstrou amizade e a quem muito respeitei, considerei providencial encontrar uma interessante biografia de John Dorr para abrir esta série “Geólogos do meu tempo”. Devo essa fonte a uma gentileza do Prof. João da Rocha Hirson. Embora o livreto não indique sua autoria, foi escrito, conforme me confirmaram ambos os autores, por Luís de Oliveira Castro e Aloísio Licínio de Miranda Barbosa, de Belo Horizonte, que permitiram sua utilização aqui. No entanto, não significa isto que seguirei um critério de amizade pessoal na seleção de biografias. Interessa-me reunir material sobre todos os que atuaram na promoção da Geologia no Brasil até o primeiro Congresso da Sociedade Brasileira de Geologia realizado em Brasília. Até então pode-se dizer que fora escrita a “pré-história” da Geologia no Brasil. Sou um desses “pré-históricos”.

Enquanto trabalhei como auxiliar do geólogo Robert Reeves, a quem depois dediquei a tese do meu doutorado em geologia, tive oportunidades diversas de estar com John Dorr, tanto no escritório da Missão Geológica na rua da Bahia, em Belo Horizonte, quanto nas áreas de mapeamento geológico, em Itabira e em Monlevade, participando uma vez de uma reunião no gabinete do Chefe do Departamento Nacional da Produção Mineral, no Rio de Janeiro, quando ele me apresentou ao Dr. Avelino Inácio de Oliveira, chefe do Departamento. Foi motivo de satisfação para mim poder ajudá-lo durante o Congresso Brasileiro de Geologia de Belo Horizonte, em 1958, congresso cuja organização fora praticamente toda de sua responsabilidade. Na véspera das excursões, como os encarregados de preparar os roteiros impressos não puderam realizar o trabalho, eu assumi a tarefa de ajudar na sua preparação e colocá-los em mãos do Dorr na manhã seguinte, no salão da Sociedade Mineira de Engenheiros. Recebi dele um esfuziante abraço, estalando palmadas em minhas costas e dizendo: “Rubem, você é meu amigo”.

John Dorr tinha uns maneirismos que, em sua pessoa, pareciam criar simpatia. Além de seu modo meio sorrindo, meio confidencial e atencioso de falar, onde estivesse em pé, punha-se a balançar o corpo para a frente e para trás; e quando dirigia, avançava um pouco o peito sobre o volante, o cigarro ao final da piteira quase a tocar o pára-brisa, parecia ter sempre pressa em chegar ao destino.

Além daqueles contactos ensejados pela atividade profissional, aconteciam também pequenas reuniões sociais e festas em casa de geólogos, inclusive uma que dei, em casa de meus pais. Encontramo-nos algum tempo depois quando passou com sua mulher pelo Recife, em casa de John Stark, na praia de Boa Viagem, ocasião em que o Núcleo da Sociedade Brasileira de Geologia local fez uma reunião extraordinária no salão nobre da Escola de Engenharia, para homenageá-lo. Outro momento especial foi o almoço, a convite seu, em 1964, em companhia também do Robert Reeves, no refinado Clube Cosmos, em Washington, onde mulheres não entravam, motivo de Dona Ann, sua esposa, ocupar-se de minha mulher com um pequeno giro pela cidade, enquanto almoçávamos.

Alguns anos mais tarde, representando o Ministro do Interior, encontrei John Dorr pela última vez, em uma reunião no Gabinete do Ministro das Minas e Energia, em que se discutiu o potencial das reservas de manganês do Brasil.

Versões em inglês por:

SELECTED BIBLIOGRAPHY OF JOHN DORR