John Thomas Stark

Hoje: 19-11-2024

Página escrita por Rubem Queiroz Cobra
Site original: www.cobra.pages.nom.br

O Recife era, para o professor Stark, – em fins da década de 1950 – em tudo semelhante às ilhas do Pacífico que havia conhecido. As mesmas ruas de areia, os confortáveis sobrados circundados por muros brancos entre coqueirais, e no centro da cidade, lojas em prédios estreitos e coloridos, a gente pobre e humilde transitando de mistura com vendedores ambulantes pelas ruelas calçadas em pedra, as roupas sempre molhadas de suor – e uma grande intimidade entre a cidade e o mar. Encantavam-no as praias desertas, os arrecifes limitando imensas piscinas de águas mornas em Boa Viagem e Piedade… “Gostaria de voltar para morrer aqui”, disse-me, uma tarde em que conversávamos no alpendre de sua casa. Ao cabo de dois anos terminaria seu tempo de comissionado no Plano americano de ajuda ao país e teria que partir, lamentava-se ele.

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Stark e um outro americano, Max White, estavam no Recife dentro do programa chamado “Ponto IV”, de ajuda técnica a países em desenvolvimento, compreendido no projeto geral de cooperação da Agência para o Desenvolvimento Internacional do Departamento de Estado Americano. A designação “Ponto IV” veio de ser aquela proposta o item 4 das ações a que se propunha o presidente Trumam, listadas no seu discurso de posse. O programa atuava em quase todo o Brasil, em diversas áreas tecnológicas. A coordenação geral estava na Embaixada, no Rio de Janeiro, onde encontrei-me com Dr. Stark pela primeira vez, e ele me falou como desejava que fosse o seu curso. A matéria não seria difícil para mim, face ao trabalho que, na ocasião, eu fazia como assistente do geólogo Robert G. Reeves em Minas Gerais (USGS professional paper 341-E), também um mapeamento geológico do Ponto IV.

Chegado a Recife em fins de 1958, Stark havia alugado uma casa de dois pisos, pequena mas muito confortável. Ficava a uma curta caminhada para a praia, por uma trilha sinuosa, sombreada por altos coqueiros, que conduzia em poucos metros à Avenida Beira-mar, em Boa Viagem. Em algumas tardes, garotas das casas vizinhas em trajes de banho se reuniam sob esses coqueiros, esticavam uma rede de um tronco a outro, e jogavam volei sobre a relva no solo arenoso, com um discreto alarido de risos, confabulações e reclamações entre elas. Stark com seus óculos de grossos aros pretos, apreciava o jogo por sobre o balcão do seu alpendre, sentado em uma cadeira confortável, sorvendo um bom uísque servido pelo seu empregado Aluísio, enquanto discutíamos geologia e os assuntos para as próximas aulas.

Cabia-me traduzir os textos para os alunos de modo que tivessem diante de si, em português, o que ele lhes diria em Inglês. As funcionárias da Secretaria, Doris e Simone, providenciavam as cópias. O material para as aulas práticas era em parte traduzido, e em parte desenhado no quadro negro.

Auxiliado por Aluísio, Stark montou uma grande prancha com tocos de madeira cravados na superfície e com as pontas aparadas com determinada inclinação, para representar uma área com afloramentos de rocha. Os alunos mediam o grau de inclinação e o rumo da face de cada ponta e, transportando os valores para o papel, faziam um mapa representativo da direção e mergulho de uma rocha estratificada. Quando concluíam um mapa, bastava girar alguns graus cada piquete para que um novo mapa, diferente do primeiro, pudesse ser preparado. Chegados ao campo, os estudantes não tinham dificuldade em repetir o procedimento e fazer o esboço das formações geológicas.

Dividíamos a mesma sala ampla, na qual tínhamos nossas mesas e Stark várias estantes com seus livros e boletins. Extremamente amável, convidava-me com frequência para lhe fazer companhia ao jantar, em casa ou restaurante, ou para completar o número à mesa, quando tinha uma visita. Íamos à praia em frente à casa, e certa vez fomos ao cinema Trianon ver “Orfeu do Carnaval”, produção franco-ítalo-brasileira de 1958, de Marcel Camus. Muitas vezes me acompanhou à área do mapeamento que seria minha tese de doutorado.

Desejando retribuir as suas atenções, em uma ida a Belo Horizonte eu adquiri algumas pedras lapidadas, semipreciosas, e de volta passei em sua casa e lhe presenteei. Alguns dias depois, estando o Aloísio de folga, fomos para sua cozinha preparar umas panquecas para jantar. O embrulho da pequena caixinha com as pedras estava na geladeira. Ele havia pensado que era a manteiga mineira que eu sempre estava a elogiar.

Em nossas conversas, Stark falava de seus amigos, das equipes de mapeamento que integrou, e do período em que foi Chefe do Departamento de Geologia da Northwestern University em Evanston hoje na área metropolitana de Chicago. Lembrava-se dos nomes dos seus alunos mais talentosos e de como apreciavam o seu “método da dúvida” para se chegar à verdade nas proposições geológicas. Relembrava com um acento de saudade sua vida nas ilhas do Pacífico e, com certa amargura, seu sofrimento com o casamento desfeito. Tinha uma pequena coleção de fotos em branco e preto nas quais aparecia no seu trabalho de campo – junto a pillow lavas e outras curiosidades geológicas –, e fotos não profissionais, entre elas uma mostrando-o no palco em uma festa divertida, imitando com os colegas do Serviço Geológico o modo de caminhar dos trilobitas; e outra, a de um grande coqueiro sob cuja coroa teria vivido um momento do seu romance mais tarde desfeito.

Em 1977, estando já aposentado, enviou seu currículo atualizado à Northwestern University, atendendo a uma solicitação de Rolf Erickson, Chefe da Biblioteca. Este documento, e a carta que o acompanhou, são as principais fontes de informação sobre a sua vida profissional de Stark. Em resposta a meu pedido de informações, as respectivas cópias me foram enviadas por cortesia do Sr. Robert Carlton, chefe do Arquivo da Northwestern. Serviram-me para ordenar cronologicamente suas confidências a respeito de sua vida e de sua carreira de geólogo. O material foi também a principal fonte para o Memorial (eulogia) escrito por E. C. Dapples, R. M. Garrels e G. F. Brown, da Geological Society of America, por ocasião do seu falecimento.

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John Thomas Stark nasceu em Jackson, Tennessee, a 1º de setembro de 1887, filho de John Thomas Knight Stark – nascido na mesma localidade cerca de 1848 –, e de Ella Shackelford Barton, nascida em 1853 em Robertson, Texas. Casados em Robertson cerca de 1872, ele faleceu cerca de 1915 e ela em 1887. O falecimento de sua mãe deu-se quando ele contava apenas nove dias de vida. Seu pai recorreu às suas sobrinhas para criá-lo, e ele as considerava suas “tias”.

Fez o curso primário e, por volta de 1903 concluiu o secundário em sua cidade natal, Jackson. Sempre fora seu desejo entrar para a University of the South, conhecida como Sewanee University, mantida pela Igreja Episcopal em uma pequena cidade próxima a Chatanogga, no sul do Tennessee, que na época mantinha vários cursos além do principal e ainda hoje aberto curso de Teologia com um Seminário anexo para formação de sacerdotes (Em 1909 restringiu drasticamente o número de cursos). Porém, a súbita doença e hospitalização de seu pai impediram-no de seguir seu projeto. Em lugar disso passou, em 1905 a trabalhar na Armour and Co., uma grande companhia de produtos animais, que tinha um escritório em Jakson. Manteve-se no emprego por dez anos, até 1915, como almoxarife, guarda livros, caixa e gerente de crédito.

Somente em 1915, ano em que completaria 28 anos, decidiu deixar sua cidade e viajar, seguindo o exemplo de dois de seus amigos: um havia se alistado na Marinha e viajava pelo mundo, e o outro fora trabalhar em Nova York. Seu pai havia morrido e não encontrava motivo para permanecer em Jackson. Solicitou demissão da Armour e viajou para São Francisco, onde passou por vários empregos para se sustentar. Pouco depois mudou-se para Portland, Oregon, onde trabalhou na seção financeira de uma grande loja de departamentos de 1916 a 1917. Lá recebeu uma carta do seu amigo de Nova York com a notícia de que conseguira para ele um emprego naquela metrópole.

Na longa viagem em que atravessaria um terço do país até Chicago – cruzando seis estados – , Stark travou conhecimento com Carl Milton Beecher (1883-1968), professor da Escola de Música da Universidade Northwestern.

Beecher, magro e moreno, descendia de uma família originária do Kent, Inglaterra. Bacharelou-se em música na Northestern (1909) onde foi professor e mais tarde o Diretor da Escola de Música. A localidade em que nasceu, Lafayette, Illinois, deve ser a mesma situada no Município de Stark (Stark County), onde está também Toulon, em cuja Academia concluiu o curso secundário em 1899. Embora Stark nada tivesse a ver com esse município que tinha o seu nome, a coincidência provavelmente aflorou na conversação e contribuiu para a mútua simpatia. Ele estava no mesmo trem que Stark provavelmente porque voltava de uma visita à irmã Nina Louise, no Oregon.

Stark e Beecher conversaram longamente no vagão panorâmico (carta a Erickson). Antes de chegar em Chicago Stark já se deixara convencer a cursar geologia na Northwestern University. Voltou a Jackson e nos quatro meses que tinha antes do início das aulas trabalhou interinamente na Coletoria do município como coletor de impostos. Finalmente matriculou-se em 1918 na Northwestern, onde faria sua carreira acadêmica.

Beecher era amigo de Ulysses Sherman Grant, o Chefe do Departamento de Geologia, e este foi quem planejou o programa de estudo de Stark. Enquanto conviveram Stark devotou-lhe grande amizade.

Stark escolheu a marinha – uma sugestão de Beecher durante a viagem (carta a Erickson) – para prestar o serviço militar obrigatório, em 1918. Fez sua graduação de bacharel em 1921 e mestrado sob orientação de Grant em 1922, e se tornou instrutor. Em 1927-28 foi à Universidade de Chicago, em Hyde Park, para seu doutorado e voltou para a Northwestern onde continuou a ensinar Geologia.

Sempre amigo de Beecher, Stark tornou-se interessado em arte figurativa, música e literatura. Ambos colecionavam água-forte e penso que Stark dominava essa técnica, pois os guardanapos em sua mesa de jantar tinham, a um canto, a figura de um demônio desenhada e impressa por ele. Além desse hobby, ele e Beecher montaram juntos uma biblioteca de literatura inglesa, disponível para os alunos. Stark chegou a dar alguns cursos especiais no Departamento de Língua Inglesa da Universidade.

Como trabalho profissional, Stark lecionava e acompanhava as pesquisas geológicas do Professor Grant na região do Lago Superior em Minesota, onde a complexidade dos vários tipos de rocha, suas estruturas e correlações estratigráficas eram um desafio. A vasta cultura que adquiriu levou-o a alargar os horizontes dos seus alunos e a ministrar aulas de geologia que despertavam excepcional interesse.

Grant faleceu relativamente moço, após uma cirurgia,em 1932. Nesse ano foi admitido membro da Geological Society of América.e tornou-se importante membro do projeto da Universidade para mapeamento do South Park, Colorado, e as áreas montanhosas adjacentes.

No ano seguinte ao da morte de Grant, Arthur Lloyd Howland, nascido na Filadélfia em Janeiro de 1908, retornou a Northwestern University. Ele havia feito seu mestrado em geologia na Northwestern, em 1931, e concluíra seu doutorado em Princeton University. Em sua volta à Northwestern foi contratado Instrutor no seu Departamento de Geologia. Howland, como Stark, estava interessado no estudo do Pré-cambriano do Lago Superior e tinha forte interesse na Literatura Inglesa. Howland esteve no Brasil durante as férias de verão de 1938, ano em que se casou. Ele e sua esposa Jean Marian Smith se tornaram grandes amigos de Stark.

Essa nova aquisição em seu círculo de amizades compensou para Stark, uma perda a mais, que foi: o afastamento de Beecher. Este, devido à saúde já frágil, precisou procurar um clima menos frio onde viver. Deixou o Departamento de Geologia e viajou para Tahiti, no Pacífico, onde adquiriu uma plantação de cocos e de vanila, e lá se estabeleceu.

Com a mudança do amigo Beecher para Tahiti, era natural que uma viagem àquela ilha passasse a ser um dos planos de Stark. Ele lá está em 1936, quando envia uma carta a um de seus amigos em Evanston, seu ex-aluno Oliver A. Jahn, na ocasião um jovem com perto de 26 anos. O jornal local, Evanston News, em 7 de outubro, presumivelmente de 1936, publicou trechos dessa carta, acrescentando que Stark havia partido em uma viagem ao redor do mundo em sua licença sabática da Universidade. Uma cópia do artigo me foi gentilmente enviada pelo acima mencionado Sr. Robert Carlton.

Oliver foi, por mais de cinquenta anos, um dos amigos mais chegados de Stark. Um especialista em questões financeiras orientou seus investimentos com grande acerto, fazendo de Stark uma pessoa de recursos. Chegaram a viajar juntos ao redor do mundo, em três ocasiões, como passageiros em navios de carga. Anos mais tarde, já aposentado e tendo retornado a Jackson, Stark ia uma a duas vezes por ano a Evanston visitar esse amigo (carta a Erickson).

Em Tahiti, Stark hospedou-se em casa de Carl Beecher que, além de dirigir seus negócios de cocos e vanila, estudava a música, os costumes e a língua dos nativos. Apesar de comparável à casa pequena de dois pisos de Boa Viagem, a casa em que moravam em Tahiti era chamada de Casa Grande pelos locais. Estava, lá como cá, a pouco mais de 100 metros do mar, separada da praia por altos e belos coqueiros, que ele considerava a árvore mais nobre e graciosa que existe. Da casa avistava Tahiti., por sobre os arrecifes e entre as hastes dos coqueiros. Era comum homens e mulheres se banharem em um riacho de águas cristalinas e refrescantes, a apenas quinze metros da sua varanda. Logo após a cerca dos fundos começava a floresta densa que subia pela encosta da cratera do grande vulcão que dominava a Ilha. Beecher la se casou a 07 de março de 1941, aos 57 anos com Ahuura Vahapata, mais nova que ele 37 anos. Não tiveram filhos e ele veio a falecer na Ilha em 1958.

Sua viagem a Tahiti levou Stark a se interessar pelo mapeamento de rochas vulcânicas. Sempre um geólogo dedicado ao trabalho de campo, ele tentou estabelecer um método para individualizar e interrelacionar derrames consolidados de lavas nas ilhas Borabora, Rajatea, e Moorea.

Entre suas viagens ao Pacífico, Stark foi convidado em 1937 a integrar como representante da Northwestern uma expedição com técnicos e geólogos do Carnegie Institution, de Washington, e do California Institute of Technology, com o objetivo de fazer um perfil geológico ao longo do rio Colorado, através do Gran Canyon. Os riscos foram enormes. Além das paredes íngremes a serem escaladas para amostragem das rochas, havia as corredeiras a serem transpostas em canoas de madeira movidas a remo. A expedição usava um rádio que funcionava mal, devido às altas paredes do Canyon e à precariedade dos aparelhos de então; somente à noite lograva-se transmissão sem ruídos de estática.

Dois anos depois, em 1939, em viagem para Tahiti, escreveu a bordo um livreto em versos, intitulado The Doggerel Log, que imprimiu em água-forte colorida. Nele, em tom amável e humorístico, comenta os pequenos incidentes acontecidos a cada um dos colegas da expedição. Um exemplar é conservado na Biblioteca da Northern Arizona University[1], entre os documentos da coleção Carnegie-Caltec expedition.

Stark ocupou a direção do Departamento de Geologia da Northwestern University de 1936 a 1943. Howland sucedeu-o pouco depois, a partir de 1945 e até 1969 na Chefia do Departamento.

Deixou a chefia do Departamento de Geologia para participar diretamente do esforço de Guerra dos Estados Unidos contra o Japão. A partir de 1944, serviu no Pacífico como Capitão e Major da força aérea da Marinha. Sua equipe estava encarregada de fazer a descrição das rotas aéreas entre os Estados Unidos e o Panamá, a América do Sul, o Norte da África e a China, uma necessidade para o caso de sobrevivência de pilotos de aviões acidentados ou abatidos. Fez manuais de sobrevivência, relatórios de inteligência, e um manual de Burma para a Força Aérea. De 1944 a 1946 foi integrado em um grupo ligado ao 15º Exército Inglês durante a segunda campanha de Burma e comandante de um campo de Instrução final em Ceylão. Foi Oficial de Ligação com os Grupos de Assalto ingleses em Penang e Singapura, e incumbido de inspecionar minas de estanho em Kuala-Lampur.

Dispensado da Aviação em 1946, voltou a lecionar na Northewestern University, porém licenciou-se da Universidade de 1949 a 1950, para trabalhar na Divisão de Minerais Estratégicos do U.S.G.S. em Washington, onde Howland também servia em tempo parcial. Foi assistente do Diretor de Minerais Estratégicos nesse período e solicitou depois seu afastamento definitivo da Northwester University, em 1952 para se efetivar no United States Geological Survey.

Daquela data até 1955 integrou a equipe de mapeamento de Guam e das Ilhas Truk no Pacífico Norte. Além de Stark (petrologia das rochas vulcânicas), a equipe incluía K.O. Emery (geologia marinha); S.O. Schlanger (calcários) C. H. Stensland (solos), e W. Storrs Cole (Foraminifera). A coordenação era do geólogo polinésio Joshua I. Tracey (USGS Professional Paper 403 A-H, publicado em 1964).

O trabalho em Guam, segundo a descrição de Stark, tinha suas dificuldades: a densa vegetação da área e rochedos difíceis de escalar, além de serem observados por soldados japoneses que não haviam se rendido e viviam na mata ainda armados.

De 1955 a 1958 ocupou-se em Washington da redação do relatório de Guam e Ilhas Truk e foi transferido da Geologia Militar para a Engenharia Geológica, e passou a supervisionar os levantamentos geológicos na Bacia do rio Delaware.

De 1958 a 1963 foi enviado ao Brasil pelo U.S. Geological. Survey para ensinar nas Universidades de Recife e São Paulo no programa do Ponto IV.

Em 1963 aposentou-se e retornou à sua cidade natal, Jackson, no Tennessee.

Geólogo e, como hoby, também escritor e poeta, Stark foi membro da Geological Society of América, da Sociedade de Poesia de New Hampshire, da Sociedade de Poesia do Tennessee e do Grupo de Escritores de Jackson, sua cidade natal.

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Tahiti significou para Stark mais que um lugar extremamente aprazível onde pode viver rodeado de amigos interessantes – encontrou intelectuais ali refugiados em consequência da guerra e dispostos a gozar a vida com requinte, no contraste com a civilização de um povo pacífico, ordeiro, extremamente simples e tranquilo, e em quem os estrangeiros não despertavam interesse especial. Além de músicos e artistas notáveis, reuniu ao seu grupo dois famosos escritores americanos que haviam passado a residir em Tahiti, Charles Nordhoff e James Norman Hall – aviadores na primeira guerra mundial e autores do best-seller Mutiny on the Bounty (1932). Sua vida feliz e prazerosa em Tahiti atingiu o ápice quando se casou com uma taitiana que lhe deu a filha Téura.

Sempre exaltou a beleza de sua mulher e mostrava-se profundamente amargurado com o divórcio que não demorou a acontecer, depois que, obrigado a servir durante a guerra, separou-se da esposa – ela não quis esperar sua volta. Nunca indaguei sobre sua mulher, por temer que fosse doloroso para ele dizer qualquer coisa a seu respeito, tal o desconsolo que mostrava quando falava da sua separação.

Sua filha viveu os primeiros anos nas ilhas com sua mãe, mas depois reuniu-se ao pai nos Estados Unidos. Seu nome, que significa “vai a bailar”, apesar de ser muito encontrado nas Ilhas da Polinésia, foi provavelmente uma escolha de Stark, . Como artista e homem culto que era, Stark deveria conhecer, e talvez admirasse, as obras do pintor francês Paul Gauguin, que vivera em Tahiti algumas décadas antes. Seu estilo de desenho, que se pode ver no citado The Doggerel Log, parece inspirado em Gauguin, assim como também as descrições que fazia das Ilhas, do seu povo e da sua cultura havia muito do romantismo de Gauguin a respeito de Tahiti – como nas anotações daquele pintor transcritas por Fabrizio Carlone em sua Opera Bonjour, Monseieur Gauguin (http://www.csw21.com/pdf/italian.pdf). Gaugin tivera por modelo e musa inspiradora uma bela nativa de nome Téura.

No segundo semestre de 1959 a filha veio visitá-lo no Recife, trazendo sua netinha. Mas o clima não era mais o mesmo. Stark não parecia muito satisfeito com a situação, talvez por influência do colega Max White que enfrentava problemas em seu curso de Geologia Econômica. Alguns dos alunos de Max White, inconformados com o modo como haviam sido reprovados sua matéria – e outros por solidariedade aos primeiros – protestaram contra as avaliações e fecharam a Escola. Stark (que nada tinha a ver com o caso) e White partiram, Stark transferido para o Curso de Geologia da Universidade de São Paulo, que possuía o mesmo currículo que o curso do Recife. Mais tarde procedi, com o Secretário da Escola Dr. Justino José Vaz de Oliveira Filho, ao arrolamento de seus livros e objetos pessoais que se encontravam em nossa sala. O material foi acondicionado e entregue a Alfred John Bodenlos, da Embaixada Americana, que fora ao Recife para cuidar da transferência.

Em uma carta que me enviou mais tarde, Stark dava conta de estar bem entrosado com o seu novo professor assistente, Reinaldo Ellert, o qual cuidava da tradução dos textos e dirigia as aulas práticas – de laboratório e de campo –, e que se sentia querido e respeitado pelos alunos. Certamente contou a eles sua aventura no Pacífico Sul porque mais tarde, em 1963, por ocasião da sua despedida, na festa em sua homenagem, seus alunos lhe deram de lembrança uma canoa cavada em tronco de árvore, como as usadas pelos nativos da Polinésia.

De baixa estatura e corpo franzino Stark era, porém, cheio de vitalidade. Sua vivacidade explica porque tinha muitos amigos bem mais jovens que ele. Disse-me certa ocasião que adorou o Japão, onde passava por pessoa alta (tinha cerca de 1,60 m de altura) porque na sua maioria os japoneses eram mais baixos. Segundo ele, havia terremotos quase todos os dias naquele país, e podia senti-los muitas vezes quando se achava almoçando ou jantando em um restaurante. Na verdade ele os teve na sua própria vida, com a morte prematura da mãe, o desamparo em que o deixou a morte do pai, a separação da esposa, o longo período da guerra, a expulsão da equipe americana do Recife… Venceu-os todos e viveu até aos 97 anos, falecendo a 10 de maio de 1984.

[1]As pranchas podem ser vistas em http://www6.nau.edu/library/scadb/recdisplay.cfm?control_num=11310

J. T. Stark Slected Bibliography

Rubem Queiroz Cobra

Página lançada em 01-09-2008.

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Para citar este texto: Cobra, Rubem Q. – John Thomas Knight Stark. Site www.cobra.pages.nom.br, Internet, Brasília, 2008.