Boas Maneiras e Etiqueta na Escola

Hoje: 29-03-2024

Página escrita por Rubem Queiroz Cobra
Site original: www.cobra.pages.nom.br

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Começando pelo lar. O comportamento que a criança ou o jovem tem em casa, é o que ele terá também na Escola. Esse fato, que é óbvio, explica porque tentar educar um aluno rebelde é frustrante. Ele confia mais na realidade que vive em casa e com seus amigos que no ideal de comportamento que a Escola tenta lhe ensinar. Por essa razão, embora esta página tenha por objeto Boas Maneiras na Escola, sua primeira parte é dedicada ao trabalho que o Orientador Educacional poderia fazer para que o aluno aprendesse a ter um comportamento educado primeiro em casa, em relação a seus pais e irmãos, e principalmente em relação a sua mãe. Se ele aderir a essa abordagem, as boas maneiras que praticar em casa terão reflexo muito favorável em seu comportamento e aprendizado na Escola.

O trabalho talvez pudesse começar com perguntas simples feitas para a classe, de modo impessoal, para quem quisesse responder, ou então dirigidas a um aluno ou aluna que concorde em ser perguntado sobre seu procedimento em casa. Exemplo: “Na hora da refeição, você espera que sua mãe sente à mesa para começarem juntos a se servirem?”

O Orientador poderá valorizar as respostas ouvindo todos que desejarem responder, e aceitar as razões que forem dadas por aqueles que, por algum motivo, não podem praticar essa norma de Boas Maneiras.

Além do exemplo acima, algumas outras perguntas poderão ser colocadas ao aluno em relação aos hábitos domésticos, ao seu contacto com os amigos, com seus parentes, ou no trânsito, etc.

Após essas perguntas, então viria a etapa de ensino, novamente focalizando primeiro o ambiente doméstico, que é a principal área de experiência do aluno e onde o seu progresso beneficiará a ele, à família, e se refletirá na Escola. Como exemplo, uma exposição, se possível acompanhada de algum recurso visual, como o desenho de uma mesa e seus lugares:

“As cabeceiras da mesa devem ser ocupadas uma pelo pai, e outra pela mãe. Os filhos sentam-se aos lados, a filha mais velha à direita do pai e o filho mais velho à direita da mãe; e os caçulas ao lado esquerdo do pai (a menina) e da mãe (o menino). Os filhos de idade intermediária ficam entre estes (o mais velho e o caçula) decrescendo as idade da menina ao distanciar-se do pai, e dos meninos distanciando-se da mãe. Mantém-se, ao mesmo tempo, mantendo-se um menino frente a outro menino e uma menina frente a outra menina. Sempre alternadamente dois meninos que se olham de frente e duas meninas que estão de frente uma para outra” (veja por favor as figuras na página Lugares à mesa).

Outros temas com maior impacto nos costumes familiares se seguiriam como:

“Se a refeição é acompanhada de uma bebida, você deve limpar os lábios antes de beber, para não sujar a borda do copo”; “Como colocar os pratos e talheres, o copo e o guardanapo, quando se prepara a mesa para uma refeição” etc.

Percebendo que aumenta o grau de interesse dos alunos, o Orientador poderá pedir, a aqueles que mostrarem desejo de colaborar, para trazerem fotos (telefones celulares dão imagens suficientemente boas para estudo) de arranjos de mesa que fizerem em casa, e analisar e comentar essas fotos.

Perguntas e temas como os dos exemplos acima irão introduzindo o aluno nas áreas de Boas Maneiras e Etiqueta, e o seu interesse por essas disciplinas deverá crescer, porque levam ao aumento da sua autoestima, diante do maior respeito que seu comportamento correto lhe poderá render. O Orientador poderá então entrar nos aspectos mais avançados da matéria como “bailes”, “restaurante”, “relacionamento no trabalho”, “influências culturais nas formas de saudação, nos modos à mesa”, “oportunidades e modos de mostrar consideração com as pessoas”, “Higiene gripal”, “Postura ao caminhar ou sentar-se”, “Combinação e adequação das roupas quanto às cores, aos ambientes, etc.” “estratégias de apaziguamento para evitar conflitos”, “Equanimidade ou reconhecimento de seus próprios sentimentos, e como lidar com eles”, e vários outros assuntos objeto das minhas páginas listadas em Boas Maneiras e Etiqueta, prazer em conhecer e praticar.

Dos temas acima, muitos se prestariam para palestras ou exposições feitas pelo próprio Orientador. Ele poderá também recorrer a visitas educativas, redação de textos, ou que outros instrumentos de ensino e demonstração possa utilizar. Alguns são susceptíveis de serem ensinados através do Teatro Pedagógico. Uma peça em três atos (apresentação, desafio, solução) é talvez o melhor modo para tratar o problema dos conflitos e permite que se criem cenas de extravasamento de sentimentos como ciúme, raiva, compreensão e compadecimento, e como controlá-los. Nestes temas, poderia o Orientador recorrer aos préstimos do seu colega, o Psicólogo da Escola, ou de um psicólogo palestrante convidado. Uma conferência feita por um psiquiatra a respeito da subordinação dos sentimentos a condições químicas do organismo seria valiosíssima.

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Etiqueta e Boas Maneiras orientadas para a Escola. O professor (Neste texto sempre substantivo neutro) com certeza sabe que, quanto a ele, Boas maneiras na Escola consiste em dar tratamento cortês aos colegas, aos funcionários, e aos alunos, e que essa prática permitirá um convívio produtivo e prazeroso para todos. Sabe que isto inclui cumprimentar os alunos ao entrar na sala de aula e ao sair; pedir “por favor” ao aluno para vir ao quadro ou para responder a determinada questão; falar com clareza e calmamente, em boa altura, sem gritar; vestir-se bem – preferencialmente ao modo conservador – ; ter sapatos ou tênis bem conservados e limpos, barba feita, etc.

Se pretende passar por rebelde e de ideias avançadas e anticonvencionais, o professor deve lembrar-se de que não tem o direito de induzir seus alunos a uma atitude igual à sua, e portanto sua aparência deve ser neutra, sem espelhar ideologias, manias e opções pessoais. Não poderá, como ocorre em certos casos, considerar a sala de aula um feudo onde exercerá poder e influência a seu bel-prazer.

Na classe deve ser assim – como de resto em todo relacionamento social: o professor jamais ofenderá a autoestima de um aluno. Com certeza ele poderá lecionar a sua matéria e tratar a todos de modo gentil, ainda que, em certos casos, seus alunos não tenham o mínimo de maturidade pessoal e inteligência para notar a consideração que recebem e, inclusive, pareçam não merecê-la. O mestre reconhecerá em tudo que puder os dons do aluno, e elogiará sua aptidão para a matéria, e seu bom aproveitamento na disciplina que estuda. Terá tolerância com aqueles alunos que são piadistas compulsivos, e poderá mesmo elogiá-los pela sua inteligência crítica, de modo a conquistar a sua simpatia e levá-lo a moderar suas observações mordazes. Porém, Infelizmente, o tratamento cortês e sincero que o professor dispensa ao aluno não é garantia de que receberá igual atenção da parte dele e que o respeito mútuo se estabelecerá, mas este professor que sabe ser cortês, sem ser ele próprio um piadista ou um sujeito ranzinza, com certeza terá mais chances de encontrar no magistério uma atividade estimulante e prazerosa.

Conflitos. Para muitos alunos a Escola pode ser a primeira oportunidade de conhecerem o comportamento social que irão aperfeiçoar mais tarde, em sua vida adulta. Os conflitos entre estudantes são como edições resumidas dos conflitos que ocorrem entre adultos em geral – entre empregados de uma grande empresa, na política, na repartição pública, e até no corpo docente e administrativo da própria Escola. Vão desde a maledicência, a intimidação, a ridicularização, a arrogância e o preconceito, até fatos mais graves como formação de quadrilhas ou de gangs, desacato à autoridade, roubo, uso de drogas, gravidez indesejada, aborto, e agressão física. Também as consequências são as mesmas: depressão, suicídio, assassinato, hospitalização e prisão. Basicamente, os mais fortes agridem os mais fracos, e estes tentam descobrir um ainda mais vulnerável sobre quem exercer algum tipo de poder. Em cada caso, os conflitos indicam como a pessoa procura alimentar ou defender o seu Ego, e manter a autoestima que sustenta sua motivação.

O intimidador pode não ser o maior e o mais forte dos alunos. Muito frequentemente é um sujeito de menor compleição física mas com talento para se fazer rodear de outros que lhe emprestam potência. Unidos, fazem chacota aos colegas na lanchonete, empurram e esbofeteiam em alguma sala vazia, no banheiro ou no vestiário, aqueles que entendem que podem intimidar e agredir. Seja como for, é do tipo provocador que os meninos mais fracos e tímidos procuram fugir. O perigo pode ser afastado pela provável vítima se esta consegue seduzir aquele que parece o mais ameaçador, ou um de seus amigos. Uma gentileza feita antecipadamente, que pareça casual e desinteressada, e que não signifique enturmar ou se ligar ao grupo delinquente, pode ser uma boa estratégia. Por ex: “Notei sua ausência ontem na aula de Geografia. Se você quiser, eu lhe passo a matéria lecionada”. Esta técnica copia o treinamento de cães, que consiste em fazer que reconheçam a palavra “amigo” repetida junto com o reforço de um torrão de açúcar.

Se para os meninos e rapazes a intimidação é a pior forma de hostilidade na Escola, para as meninas a pior é serem rejeitadas por grupinhos de colegas, e o descaso de rapazes pelos quais gostariam de ser cortejadas. Jovens zombadores que se pretendem charmosos escolhem entre as jovens mais ansiosas por amizade e aceitação, aquela que será objeto de risos e cochichos maliciosos. Esta, devido à sua ansiedade por reconhecimento, simula bom humor no papel de vítima, para ela melhor que estar totalmente excluída. Mas, se na Escola consegue sustentar uma aparência feliz, fora dela cai em depressão, agride os pais nos quais põe a culpa pela inferioridade em que se sente, incapaz de perceber que a verdadeira causa da situação não é que ela seja diferente, mas sim a sua má interpretação da própria situação. Na verdade o grupo dominante reúne somente aquelas meninas ou rapazes afinados com o sistema criado por eles para lidarem com sua própria ansiedade. Todo o esforço que uma estranha fizer para se integrar será causa de mais zombaria e humilhações. Compreender qual é a verdadeira situação fará cair o encanto e a sedução de que é vítima. Poderá amar o seu isolamento e fazer render melhor o seu tempo, ou criar com outras colegas um sistema independente de mútua consideração e respeito.

Solução de conflitos. A única autoridade legítima do professor deveria ser sobre a matéria que ele ensina. Não cabe a ele a responsabilidade sobre o comportamento do aluno. Portanto o professor não daria ordens como, por exemplo, que o aluno se retire da sala de aula. Não pune com notas baixas, mas apenas avalia.

O comportamento do aluno deve ser objeto de um contrato entre ele – o aluno, representado por seus pais –, e a Escola. É, portanto, essencial que um contrato com cláusulas sobre o comportamento do estudante – cobrindo inclusive o uso correto do material de informática da Escola –, seja assinado no ato da matrícula, mais do que uma simples declaração de conhecer e aceitar as Normas de Funcionamento do Estabelecimento.

O contrato assinado pelo aluno e por seus pais com a Escola deve fazer alusão clara ao relacionamento conflituoso, detalhar preconceito, humilhação, agressão, zombaria, colocação de apelidos e, depois de nomear todas as formas de atazanar colegas, dizer as medidas a serem aplicadas aos infratores, tudo de modo claro e explícito, para que a Direção possa agir prontamente em função dessa cláusula contratual.

Como em geral a origem desse comportamento agressivo vem do próprio lar dos delinquentes, e representa algo vital para ele no universo das suas carências, é pouco provável que haja um discurso eficaz que possa por fim à situação. Por isso as soluções mais drásticas como apelar para a polícia devem ser mencionadas e tem mais probabilidade de suspender a ação do malfeitor que a ameaça de expulsão do estabelecimento. Os pais da vítima devem acionar a Escola no caso do descumprimento da cláusula de vigilância e disciplinamento a que a Escola estará obrigada pelo mesmo contrato.

Se necessário, e este pode ser o caso de escolas localizadas em áreas de risco, a Direção manterá um Assistente presente em cada sala de aula. Sua atividade, porém, não se estende fora da Escola, Um segurança armado, com direito a uma guarita blindada, deve estar postado do lado de fora da entrada, a fim de proteger os alunos contra gangs, vendedores de droga, aliciadores de menores, sequestradores, etc. Ao “Assistente Escolar” que tenha as mesmas funções do antigo “Disciplinário”, compete controlar a disciplina e a movimentação de alunos no âmbito da Escola e desempenhar as atividades disciplinares e de segurança que lhe forem atribuídas pela Direção e referidas no contrato de matrícula do aluno. Deve acorrer prontamente a qualquer ponto onde um problema disciplinar se apresente.

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Rubem Queiroz Cobra

Página lançada em 07-03-2008.

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Para citar este texto: Cobra, Rubem Q. – Boas Maneiras e Etiqueta na Escola. Site www.cobra.pages.nom.br, Internet, Brasília, 2008.